Após reforma trabalhista, patrões atacam negociação por empresa e homologações
Entre os muitos objetivos do PLC 38/2017, que instituiu a reforma trabalhista, o sangramento das organizações sindicais talvez seja o mais festejado por quem não gosta de negociação e direito para a classe trabalhadora.
Sob o argumento de que o imposto sindical sustentou por décadas dirigentes sindicais pouco interessados na luta em defesa de seus representados, o pacote de medidas do golpista Michel Temer (MDB) não só retirou a sustentação das organizações trabalhistas, como também embutiu uma série de retrocessos que fragilizam o trabalhador na relação com o empregador.
Segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), o número de registros de convenções coletivas na base do Ministério do Trabalho até junho deste ano caiu em torno de 30%, quando comparado com o primeiro semestre de 2017.
O acordo coletivo é aquele restrito à empresa, enquanto a negociação coletiva abrange toda a categoria. Para o técnico do Dieese Luís Ribeiro esse cenário se explica porque é mais fácil minar a luta dos trabalhadores nas células empresarias do que enfrentar toda a categoria.
“Essa parece ser uma tendência pós-reforma trabalhista. Assim como a batalha dos empregadores para retirar a homologação dos sindicatos e minar qualquer tentativa de financiamento sindical, já que alguns advogados entendem que a cobrança da contribuição negocial pode ser repassada a todos os trabalhadores, desde que aprovada em assembleia, enquanto outros entendem que deve ser formalizada um a um. Também percebemos que cláusulas de jornada de trabalho, desde intervalo até flexibilidade, começam a aparecer”, aponta Ribeiro.
Independente de qual seja a estratégia, a ideia é desmoralizar quem faz a luta. Na Bahia, o Sindpec (Sindicato dos Empregados em Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas do Estado) passa por um momento tenso na relação com a base após uma tramoia da Fapex (Fundação de Apoio à Pesquisa e à Extensão) para cobrar o imposto sindical.
“A empresa que tem trabalhado muito para informar sobre a desautorização do imposto, resolveu cobrar 3% sobre o salário do mês antecipado antes de encerrarmos a discussão e estimulou os trabalhadores a virem até o sindicato solicitar a devolução. Devolvemos tudo para a empresa! Quando chegamos a esse índice, em negociações anteriores, era descontado em três vezes e de acordo com o índice que alcançávamos, neste ano conquistamos aumento real de 1,69%. Isso é uma das táticas sujas que utilizaram, mas não vão nos impedir de fazer o trabalho de base”, garante a diretora executiva do Sindpec, Joilda Cardoso.
Outro ponto que tem causado conflito entre trabalhadores e patrões é a homologação, a conferência dos valores em caso de rescisão, que antes da reforma deveria ser feita obrigatoriamente com a presença do sindicato para dar mais segurança ao trabalhador.
Tirar o sindicato da frente
Segundo o diretor de Comunicação e Imprensa da Federação dos Trabalhadores no Comércio e Serviço do Ceará (Fetrace), Francisco Neto, a campanha salarial unificada da categoria que tem data-base em maio foi atrasada pelos empresários para aguardar a reforma e agora enfrenta pressão pelo fim da homologação.
“Além das negociações salariais não avançarem para além da inflação, estão tentando impedir a homologação porque é nessas horas, sem a pressão do empregador, que conferimos se as verbas estão sendo pagas direito e como estão as condições na empresa. É um contato fundamental com a base”, diz.
No Distrito Federal, a Fetracom (Federação dos Trabalhadores no Comércio e Serviços), com data-base também em maio, se depara com a realidade do trabalho intermitente. Segundo o secretário jurídico da entidade, Jackson Ázara, a entidade conseguiu resistir e manter a homologação no sindicato, assim como a contribuição negocial inserida na negociação coletiva.
No setor de serviços, foi possível arrancar 1,7% de aumento real, mas no de eventos, onde a flexibilidade é maior, a disputa seque quente.
“Estão batendo muito forte na questão do trabalho intermitente e, após grande batalha, conseguimos ao menos inserir regras para limites de contratação, estabelecendo que não atinja os que já estão trabalhando e que, se houver vaga para efetivo, sejam priorizados os intermitentes”, explica.
Ir para cima
Para o presidente da Contracs (Confederação dos Trabalhadores no Comércio e Serviços), Alci Matos, apesar dos retrocessos, o golpe e a reforma trabalhista permitirão que os trabalhadores enxerguem os sindicatos como aliados ainda maiores do que eram.
“Para sobreviver, o sindicato terá de estar presente na base, informando e orientando o trabalhador. E o trabalhador, por sua vez, para ter condições dignas, terá de entender que o sindicato é um instrumento fundamental para impedir a retirada de direitos. Por isso mesmo é alvo dos patrões que financiaram o golpe, inclusive nas lutas para além do ambiente de trabalho, como por moradia digna, educação pública de qualidade, saúde e segurança”, explica.
A diretora do Sindpec, Joilda Cardoso, acredita que a hora agora é de retomar a utopia e pensar grande. “Estão tendo atitudes para que sindicatos se acovardem e se afastem e, mais do que nunca, temos que ir para cima. Está faltando a gente acreditar na gente para se manter na luta e aproveitar esse momento crítico para promover uma nova era de lutas e conquistas”, defende.