Humilhação e vergonha são produto de relações individuais entre empregados e patrões

Nesta semana, em diversas regiões do país, trabalhadoras e trabalhadores se postaram de joelhos nas ruas e avenidas orando e clamando pela reabertura das atividades comerciais, sob imposição dos patrões.

Sugiro aos parlamentares de todos os partidos e aos ministros do Supremo Tribunal Federal que, mesmo tardiamente, vejam as consequências de suas decisões.  As humilhações impostas pela classe patronal, revelam cenas de submissão, que ocorrem quando o trabalhador ou trabalhadora se apresenta individualmente frente ao patrão, sem a devida proteção de seus sindicatos.

Como muito bem escreveu o jurista Wilson Ramos Filho (Xixo), para a classe patronal “não basta explorar os trabalhadores, é necessário humilhá-los, fazer com que se curvem, se ajoelhem para preservar seus empregos”.

As imagens são fortes e revelam a estratégia patronal baseada na humilhação pública como forma de dominação. As cenas são tristes e explicitam o oportunismo de empregadores sem sensibilidade, que se orientam por valores e padrões de comportamento típicos de senhores de escravos e seus vigias armados de tacões.

A classe trabalhadora e suas organizações sindicais têm agido de forma civilizada, discutindo, dialogando e apresentando suas razões no parlamento e nos tribunais, mas cresce a percepção de que diante de violências como estas serão necessárias reações à altura.

Todos estamos assustados e sofrendo com as vidas que o Brasil tem perdido com a pandemia do Covid 19. A postura irresponsável do governo federal que desprezou a gravidade da situação está resultando, não apenas em um crescimento assustador da contaminação e das mortes, mas também na superlotação dos hospitais. Em alguns estados já não há respiradores suficientes e as UTIs estão lotadas.

Diante de uma situação dramática como essa, frente às insuficientes medidas adotadas para estancar a contaminação e à insuficiente liberação de recursos para garantir o pagamento dos salários, trabalhadores e trabalhadoras encontram-se ameaçados pelo rebaixamento salarial e desemprego. Desesperados porque precisam de recursos para sobreviver submetem-se a situações degradantes, muito bem retratadas nas imagens de homens e mulheres de joelhos em frente às lojas. Elas simbolizam e evidenciam até onde a dominação sem defesa coletiva pode submeter aqueles que vivem de salários à espoliação e à desmoralização.

Dirijo-me, portanto aos parlamentares e integrantes do Poder Judiciário para lhes chamar a atenção sobre as consequências de suas decisões, tomadas sem considerar os argumentos apresentados pelos sindicalistas e advogados dos trabalhadores.

Estas manifestações são organizadas por empregadores que tratam seus trabalhadores como coisas sem alma, que podem ser usadas para todo e qualquer tipo de atividade que favoreçam seus interesses e propiciem condições adequadas para acumularem riqueza.

A MP 936 continuará a promover este tipo de situação, caso o Congresso Nacional não faça alterações que garantam a presença dos sindicatos nas negociações e a cobertura integral do salário dos trabalhadores durante a pandemia. A classe trabalhadora já se vê ameaçada pela Covid19 e vê crescer o risco de contaminação caso prevaleçam as decisões precipitadas de suspensão do isolamento social. Cresce o risco de morte frente à superlotação de hospitais e inexistência de respiradores e UTIs suficientes para atender a população.

Acordos individuais são realizados aos milhares, pois a situação é dramática. Desamparados os trabalhadores não têm como se livrar de acordos individuais com retirada de direitos e remunerações rebaixadas. E ainda por cima, a classe patronal oferece esta cena lamentável. Trabalhadores e trabalhadoras uniformizados, se postam de joelhos, em frente às lojas, para pedir em posição de oração, reabertura assassina do comércio em um Estado que já tem o sistema hospitalar em colapso. Lugar onde nem todos que se apresentam contaminados conseguem respiradores e internamento adequado para enfrentar este forte vírus, chamado por Bolsonaro de “gripezinha”.

Está certo o jurista e professor de direito Wilson Ramos Filho (Xixo): a classe patronal expôs com esta atitude “o capitalismo como ele realmente é, sem mediações, sem ocultação ideológica”. Até quando vamos resistir de forma passiva a essas agressões? Até quando veremos nossa gente ser submetida a humilhações como essas?

Decisões levianas e irresponsáveis da dupla Bolsonaro e Guedes e do Poder Judiciário revelam a importância de que o parlamento faça as correções na MP 936, não se dobrando aos interesses apenas da classe patronal. Ao mesmo tempo evidenciam quão arraigado está o ódio espalhado pelo governo e seus seguidores, a ponto de encorajar empregadores a retirarem suas máscaras e revelarem quão demoníacas podem ser suas ações.

Valeir Ertle – Secretário Nacional de Assuntos Jurídicos da CUT e integrante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD)